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Casas de Sementes Crioulas preservam as riquezas naturais e garantem comida de verdade

Áreas de Atuação

No Ceará, Casas de Sementes preservam a memória genética e as variedades de sementes crioulas

Publicação: 04/07/2024


 Na zona rural de Sobral (CE), no sítio Contendas, a Casa de Sementes São José se firma como referência naquela microrregião pelo seu incentivo e trabalho na continuidade da tradição de cuidar, estocar e preservar sementes crioulas. Essas sementes, também conhecidas como “rústicas” e “naturais”, são remanescentes dos tempos ancestrais, modificadas e adaptadas pela natureza e pelo manejo praticado por agricultores e agricultoras através de gerações. Entidades como Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) e a Articulação Semiárido Brasileiro (ASA) as consideram verdadeiros tesouros da agricultura.

Porta adentro, a Casa de Sementes das Contendas abriga um rico e diverso universo. Ali, garrafas e mais garrafas PET, nomeadas, datadas e organizadas em prateleiras, guardam sementes crioulas em ampla diversidade, garantindo estoque para plantio e conservando a história e genética das sementes.

Em meio a essa riqueza, as cores se destacam e revelam variações de feijão, milho, fava, macaxeira, jerimum, maxixe e outras culturas que, sem esse trabalho na região - no estado, no Brasil e no mundo -, poderiam estar extintas.

Para a agricultora e coordenadora da Casa Lúcia de Souza, a semente crioula acumula características invejáveis: são resistentes, adaptáveis ao clima e solo e mantém a qualidade após vários plantios. “Com elas, temos a confiança de que trabalhamos com sementes de qualidade, que vão brotar bem”, declara.



Luís “Pia”, agricultor familiar e coordenador da RIS Zona Norte. Foto: Alana Soares/Comunicação Cáritas/P1+2


COMO FUNCIONA UMA CASA DE SEMENTE

Assim como na Casa São José, as demais 324 casas de sementes no Ceará (segundo dados da Cáritas e do Fórum Cearense pela Vida no Semiárido) funcionam com sistema de empréstimo e devolução, adicionando um percentual para ampliar o estoque comunitário.

“Um deixa algumas garrafas de milho e leva de feijão. Outro deixa feijão e leva de fava. É assim. Compartilhando a gente cresce junto”, explica o coordenador da Rede de Intercâmbio de Sementes (RIS) da Zona Norte, Luiz “Pia” Sousa do Nascimento.

O trabalho é voluntário e basta ser sócio para participar. “Aqui eu achei um apoio e uma segurança”, revela a agricultora Elecilda da Silva. “É de grande proveito todo esse aprendizado das sementes e unimos mais a comunidade”.

No geral, as Casas são formadas por agricultores e agricultoras, quilombolas, assentados e assentadas de reforma agrária.




Também faz parte do trabalho orientar os sócios sobre as melhores práticas de produção e manejo, uso exclusivo de defensivos naturais e como evitar contaminação com sementes híbridas ou transgênicas, aquelas que são geneticamente modificadas e geralmente precisam de agrotóxicos para se manter.

Estocagem, rotatividade, preservação da diversidade e o fácil acesso às sementes fazem parte da estratégia de organização comunitária elaborada pelas Casas de Sementes junto às organizações sociais e sindicatos rurais para a valorização da cultura local, promoção da autonomia e segurança alimentar e nutricional das famílias rurais do semiárido. Não à toa, aqueles que conservam as sementes crioulas são chamados de “guardiões das sementes”.



Para Lúcia, coordenar as atividades da Casa de Sementes é um trabalho voluntário que dá gosto. Foto: Alana Soares/Comunicação Cáritas/P1+2


SEMENTE RESISTENTE

Como a semente crioula não precisa de defensivos químicos, o produtor planta, colhe e consome alimentos mais saudáveis, fato que contribui para sua saúde e para a natureza. “O agricultor que usa e guarda sementes crioulas tem mais autonomia sobre sua produção e alimentação”, afirma o técnico em agropecuária Leonardo Vieira, também assessor das 16 Casas de Sementes acompanhadas pela Cáritas Diocesana de Crateús. “É a semente crioula que garante a alimentação da família do campo”, enfatiza.


O QUE É A REDE DE INTERCÂMBIO DE SEMENTES?

A Rede de Intercâmbio de Sementes do Ceará (RIS) surgiu em 1991, com o objetivo de organizar, articular e estruturar as Casas de Sementes, promover feiras e encontros, incentivar a troca de experiências e saberes entre territórios e ser instrumento de representação e incidência política na construção de políticas públicas sobre sementes e agroecologia. Atualmente existem as RIS Territoriais Cariri, Centro-Sul, Vale do Jaguaribe, Inhamuns-Crateús, Zona Norte, Ibiapaba e Três Climas.

 


Foto: Adilson Rodrigues Nobrega/Embrapa




Esta publicação faz parte do Boletim O Candeeiro Edição 2473, de 2024, produzida pela Comunicação Popular do Programa Uma Terra e Duas Águas (P1+2).

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